Eis os distintos troféus do Torneio Norte-Nordeste em 1968, 1969 e 1970. Podem ter releitura.
No Século XXI, a CBF já equiparou três competições extintas ao Campeonato Brasileiro, criado de fato em 1971. Em 2010, a entidade unificou os dez títulos da Taça Brasil, realizada de 1959 a 1968, e os quatro do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, de 1967 a 1970. No ano passado, após nova análise, a confederação também reconheceu o Torneio dos Campeões de 1937 como título nacional. A partir da revisão daquela conquista do Atlético Mineiro virou um vespeiro que agora pode chegar até em competições realizadas no Norte-Nordeste.
O precedente aberto pela CBF
Recentemente, no blog, abordei o tema sobre o pedido do senador Romário para que o América-RJ seja reconhecido como campeão brasileiro de 1982, através de outra competição paralela ao Brasileirão. Naquela temporada, a principal competição foi vencida pelo Flamengo. Aprofundando, existem outras possibilidades com argumentos plausíveis nos âmbitos técnico, histórico e legal, como até o tradicional Torneio Rio-São Paulo, considerando as edições até 1966. Depois, o Rio-SP foi ampliado e virou justamente o Roberto Gomes Pedrosa, conhecido como “Robertão”. E o Robertão é mesmo a peça-chave. O precursor do Brasileirão, em termos de formato, foi assumido pela então Confederação Brasileira de Desportos em 1968 – a entidade só viraria “CBF” onze anos depois.
Aquela competição foi realizada só com convidados, tendo 17 times nas três versões com a CBD, em 1968, 1969 e 1970. Para abarcar mais clubes após os Estaduais, a entidade promoveu mais três competições “nacionais” em 1968, além do Robertão vencido pelo Santos: a Taça Brasil (Botafogo), o Torneio Norte-Nordeste (Sport) e o Torneio Centro-Sul (Grêmio Maringá). No fim, o objetivo era promover o “Torneio dos Campeões” entre os quatro vencedores, valendo vaga na Libertadores. Ocorre que a desorganização foi enorme, com a Taça Brasil acabando só em 1969 e o Santos desistindo do confronto contra o Maringá. E o Brasil sequer teve representante na copa continental, pois brigou com a Conmebol! Já nos dois anos seguintes não houve nem Taça Brasil nem Centro-Sul.
Premissa parte da finalidade do torneio
Ou seja, a continuidade do “calendário nacional” em 1969 e 1970 teve apenas o Torneio Roberto Gomes Pedrosa, visto já como campeonato nacional, e o Torneio Norte-Nordeste, apelidado de “Brasileirão do Norte”, alcunha utilizada posteriormente até pela revista Placar – os outros títulos inter-regionais foram de Ceará e Fortaleza, respectivamente. O N-NE foi mesmo criado para suprir a demanda de uma região que vinha tendo resultados consistentes na Taça Brasil, com um título e cinco vices, mas cuja participação no Robertão foi diminuta. O Nordeste teve apenas dois clubes convidados no “Brasileirão do Sul” (essa alcunha não foi utilizada). O Bahia por três vezes, tendo a companhia do Náutico no primeiro ano e a do Santa Cruz nos outros dois anos. E o Norte? Ninguém foi chamado.
Ainda que a disparidade no nível técnico seja evidente, ainda mais numa época com a Seleção sendo dominante, a finalidade daquela competição inter-regional pesa neste debate. A competição promoveria o campeão a uma fase final nacional com outros dois torneios que foram reconhecidos em 2010. Foi isso que começou a mover os clubes agora, ainda que com atraso. Em dezembro de 2023, o presidente do Conselho Deliberativo do Ceará confirmou a movimentação em busca do reconhecimento. José Barreto Filho disse ao jornal Povo que o clube alvinegro convidou os outros dois campeões, Fortaleza e Sport, para a solicitação. O dirigente disse até que “não é difícil de acontecer”. No Recife, o presidente executivo do Sport, Yuri Romão, já falou sobre a existência disso, mesmo sem tanta pressa.
O peso do reconhecimento
Entre esses estudos internos alimentados por pesquisas em jornais e documentos oficiais, destaque para o dossiê produzido por Lucas Barcelos e Ewerson Vasconcelos. Também há o levantamento de Mauro Bastos, focado em 1969. Particularmente, sempre tratei a unificação dos títulos brasileiros como uma equiparação histórica, mas sem a necessidade de renomear algo para valorizá-lo. Exemplo: a Taça Brasil do Bahia de 1959 não precisa ser rebatizada de “Campeonato Brasileiro de 1959” para valer o tanto que já valia. No caso dessas três edições do antigo Torneio Norte-Nordeste, e não confunda com a fase N-NE dentro da Taça Brasil, que era outra competição, as taças são oficiais desde sempre. E com nomes bem definidos.
Inclusive são três belos troféus, bem conservados e expostos nas sedes da Ilha do Retiro, de Porangabuçu e do Pici. As peças têm o peso de duas enormes regiões do país, numa disputa com dezenas de clubes envolvidos num momento de construção da identidade do futebol nacionalizado. Pra mim, já são títulos importantes independentemente de uma oficialização como “título nacional” ou mesmo uma revisão segmentada como “Brasileirão do Norte”. A questão me parece outra. Em 2010, ao mergulhar na história, a CBF não foi tão ao fundo quanto devia, deixando margem para muitos questionamentos em décadas de torneios integradores antes de 1971. Esses entre 1968 e 1970 se encaixam nisso de alguma forma.
Leia mais sobre o assunto
Após pedido de Náutico e Vitória, CBF abre processo para unificar títulos do Nordeste
Torneio Norte-Nordeste de 1968
23 clubes participantes
Campeão: Sport (20 jogos; 16V, 2E e 2D)
Vice: Remo (16 jogos; 8V, 2E e 6D)
Torneio Norte-Nordeste de 1969
26 clubes participantes
Campeão: Ceará (21 jogos; 12V, 6E e 3D)
Vice: Remo (19 jogos; 12V, 3E e 4D)
Torneio Norte-Nordeste de 1970
36 clubes participantes
Campeão: Fortaleza (18 jogos; 9V, 6E e 3D)
Vice: Sport (17 jogos; 9V, 5E e 3D)