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O “venturismo” foi decisivo para a permanência do leão na elite. Foto: Anderson Stevens/Sport.

Esta é a 10ª participação do Sport na primeira divisão na era dos pontos corridos. Sem dúvida alguma, foi a edição em que o clube entrou mais debilitado, imerso numa crise financeira, tendo a menor folha da competição e sem resultados efetivos. Por falta de organização tática e, sobretudo, de elenco, inferior ao da campanha na Série B. Considerando as competições prévias, o leão chegou à Série A com o pior rendimento entre os vinte clubes, com 46% em 22 jogos – somando Pernambucano (1ª fase), Copa do Brasil (1ª fase) e Copa do Nordeste (quartas).

A vitória na estreia do Brasileirão, sobre o Ceará, com três gols no primeiro tempo, foi bem fora da curva para o momento, com a falta de qualidade impondo a dura realidade logo depois. Até a queda de Daniel Paulista, com o time já na zona de rebaixamento. E lá parecia fadado a ficar. O Sport era o maior favorito ao descenso nas análises de comentaristas país afora, incluindo ESPN e Globo. Particularmente, eu achava que o clube poderia repetir um desempenho a la América-RN de 2007, com apenas 17 pontos – ainda hoje o recorde negativo. A virada na campanha, da forma mais surpreendente já vista na Ilha do Retiro, começou em 24 de agosto, no anúncio de Jair Ventura, que não trabalhava há quase duas temporadas.

A seguir, quatro tópicos sobre a caminhada do Sport de Jair e, na sequência, um vídeo do blog.

Escolha voltada para a defesa
No dia da contratação, escrevi no blog: “a proposta é clara: foco na defesa”. Era óbvio o motivo da escolha. Sem força no ataque, era preciso ao menos montar um time sólido, para depois tentar ser certeiro nas poucas chances criadas. E isso Jair sabe fazer bem, com a marcante passagem no Botafogo em 2016/2017. No leão, o técnico assumiu na 6ª rodada, basicamente sem treino. E quase pontuou, mas um pênalti infantil do goleiro Mailson, aos 48 do 2º tempo, definiu o revés na estreia.

Poderia ter sido um golpe definitivo no espírito do Sport, já mal. Porém, houve um abraço à estratégia mais defensiva, com uma enorme obediência tática do elenco. De lá pra cá o perfil das atuações foi quase sempre o mesmo, com posse de bola bem abaixo de 40%, poucas oportunidades de gol (pelo sistema e pelo próprio nível técnico), mas com uma defesa sólida o suficiente – até com linhas de 5 – para garantir a possibilidade de resultado até o último lance. Tanto por segurar vantagens mínimas (o máximo que o time conseguia) quanto por sustentar desvantagens mínimas.

Os grandes resultados em Porto Alegre
E assim vieram as vitórias no limite. Das 12, 11 foram com Jair, das quais 10 por 1 gol de diferença. A evolução partiu do 2 x 1 sobre o Grêmio dentro de sua arena, com 28 x 5 em finalizações a favor do mandante – mas a maioria na bola aérea, com os rubro-negros forçando o adversário à jogada devido à maior condição defensiva. Aquele resultado tiraria o Sport do Z4 para sempre, apesar do flerte. Isso porque o leão sempre “respondeu” quando a entrada na zona ficou escancarada.

Tal espírito de decisão, e foram várias decisões nesse tempo todo, seguiu até o outro resultado enorme obtido na capital gaúcha, sobre o Internacional, então líder isolado, já na 35ª rodada. Outro triunfo por 2 x 1, com o time recifense mantendo o trio defensivo mesmo com um mais em campo. Afinal, a proposta era pontuar, por mais que alguns críticos enxergassem a falta de apetite – talvez por desconhecimento da equipe analisada. A vitória possibilitou a chance de uma permanência improvável, confirmada na 37ª rodada, mesmo perdendo do Galo na Ilha do Retiro, pois o Vasco, em jogo simultânero, não conseguiu vencer o Corinthians em São Paulo.

Competividade mesmo com elenco esvaziado
Ou seja, aquele jogo no Beira-Rio encaminhou uma permanência sem o sufoco da última rodada como mas últimas três campanhas – ficando em 2016 e 2017 e caindo 2018. E isso com a média de gols sendo inferior a 1 por jogo, a terceira pior da edição. Fez apenas 31 gols em 37 jogos, embora Jair tenha se arriscado algumas vezes à frente, com pouquíssimo sucesso (e ele entendeu a carência do setor). Já a defesa foi muito mais consistente do que nessas campanhas, com 10 gols a menos.

Variando entre dois e três zagueiros (Maidana, Adryelson, Thyere e Chico) e dois e três volantes (Marcão, Betinho, Ronaldo, Ricardinho etc), todos conectados. Lá na frente, a chegada de Thiago Neves acabou sendo o lampejo de qualidade no time – só um nome, mas suficiente para render pontos importantes, quase sempre por 1 x 0, claro. Futebol tem disso. E este rendimento além do imaginado para esta equipe, que ainda perdeu alguns dos poucos valores (Mugni sem contrato, Jonatan Gómez por rescisão e Barcia por lesão), valeu uma saúde financeira em falta há tempos.

Campanha acima do Z4 evita o caos
Em 2018, envolvido numa gestão catastrófica, o clube já estava à beira do colapso, para onde mergulhou com o rebaixamento, uma vez que não haveria mais a cota cheia na Série B – em vez de R$ 40 milhões de TV, apenas R$ 6 mi. Assim, o acesso já foi surpreendente, embora “justificado” pelo gasto excessivo, com déficit de R$ 22 milhões. Para 2020 essa conta chegou, inclusive da Globo, cobrando R$ 16,5 mi de adiantamentos passados. No fim, a chance de ficar veio atrelada a uma premiação oficial de R$ 11 milhões (bastava não cair), com o clube prometendo repassar R$ 4 milhões deste montante ao time em caso permanência, num “investimento” com retorno evidente.

Tanto que, para a temporada efetiva de “2021”, o Sport tende a voltar a um patamar próximo a R$ 100 milhões de receita, podendo otimizar o elenco, com uma folha mais robusta, e pagar débitos – que não param de surgir. Não parecia possível, mas o venturismo salvou o ano. As permanências em 1991, com uma combinação impressionante na última rodada, e em 2017, vencendo os últimos 3 jogos, eram as mais marcantes do Sport na Série A. Pelo resgate de uma campanha condenada antes da estreia, a partir de uma organização tática imediata, tendo como consequência um reequilíbrio financeiro vital, considero esta de 2020 a maior permanência da história do Sport. E que acaba por surpreender ainda mais ao não ser a mais difícil dentro de campo…

Jair antes de consumar a permanência: “será o maior trabalho da minha carreira”. Agora é.

As dez campanhas do Sport na Série A nos pontos corridos (38 jogos)
2007 – 51 pontos; 14V, 9E e 15D; -1 (14º)
2008 – 52 pontos; 14V, 10E e 14D; +3 (11º)
2009 – 31 pontos; 7V, 10E e 21D; -23 (20º)*
2012 – 41 pontos; 10V, 11E e 17D; -17 (17º)*
2014 – 52 pontos; 14V, 10E e 14D; -10 (11º)
2015 – 59 pontos; 15V, 14E e 9D; +15 (6º)
2016 – 47 pontos; 13V, 8E e 17D; -6 (14º)
2017 – 45 pontos; 12V, 9E e 17D; -12 (15º)
2018 – 42 pontos; 11V, 9E e 18D; -22 (17º)*
2020 – 42 pontos; 12V, 6E e 19D; -17 (14º)**
* Acabou rebaixado
** Ainda falta uma rodada

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Abaixo, assista a um comentário do blog sobre a campanha do Sport de Jair, via Youtube.


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